O artigo "A Internet de Valor" foi assinado por Ricardo Schiller Pinto, Head of Research & Development da agap2IT, e publicado na Exame, a revista de economia e negócios líder em Portugal. Leia-o abaixo:
Quais são as inovações mais importantes para a humanidade? Considerada como a inovação mais importante do último milénio, a prensa de Gutenberg permitiu escalar e massificar a distribuição e acesso a informação escrita, potenciando assim, incalculavelmente a evolução da espécie humana, trazendo à luz o iluminismo e consequentemente a revolução científica. Isto aconteceu há meio milénio.
Ao contrário da televisão e da rádio, considero a internet como uma inovação equivalente à prensa Gutenberg, que novamente exponenciou a partilha e acesso à informação, tendo dado origem a uma nova era que temos vindo a chamar de revolução digital. Há apenas trinta anos, ninguém sonharia que um dia haveria a quantidade, qualidade, e diversidade de informação que hoje em dia temos disponíveis à distância de um click.
Mas esta revolução digital ainda está só no início, e ninguém sabe o que é que uma sociedade mundial interconectada com meia dúzia de décadas nos trará.
Isto leva-nos à mais recente inovação, a das criptomoedas, que começou com o advento da Bitcoin, e levou à explosão de todo um novo ecossistema. Trata-se da internet de valor, aonde agora é possível criar e transmitir valor pela internet sem ter que recorrer a intermediários. Com uma facilidade cada vez mais igualada com a da criação de um website, qualquer um pode criar a sua criptomoeda neste novo mundo. É um faroeste financeiro, onde a lei tem muita dificuldade em acompanhar.
Há de tudo, desde projetos verdadeiramente interessantes que procuram avançar o espaço, até aos maiores ponzi schemes que alguma vez existiram, e toda uma multidão que salta de projeto em projeto, com a finalidade de exponenciar o seu capital. Fazem-se e perdem-se fortunas de um dia para o outro. Uns ficam milionários num par de meses, outros perdem todas as poupanças.
Mas tenhamos calma, isto há de parar, os governos irão intervir e tudo voltará àquilo que estamos habituados… esqueçam isso. Goste-se ou não desta nova tecnologia, ela veio para ficar, e nada a parará. À data de hoje, o único ponto frágil desta rede de valor é a entrada de capital, onde a moeda fiduciária é transformada em criptomoeda. Depois dessa conversão: adeus lei! Tudo o resto pode ser feito de forma descentralizada. Estamos a falar de DeFi (Decentralized Finance) onde a negociação, alavancagem, empréstimos, depósitos a prazo, e toda uma multitude de produtos financeiros podem ser oferecidos e utilizados sem supervisão ou controlo de entidades estatais. E caso as nossas operações financeiras possam ser consideradas dúbias, nada como mecanismos de ocultação do rasto de transações.
Mas então será quando quiserem converter novamente para moeda fiduciária que aí os apanharemos! Exigiremos que paguem impostos e que apresentem todo o rasto de operações que fizeram. Os EUA foram especialmente rápidos nesta vertente. Mas isto só fará com que a médio prazo deixe de haver uma conversão de criptomoeda para moeda fiduciária. As pessoas simplesmente manter-se-ão no espaço. Então bane-se as criptomoedas! Um país bane-as, só para outro as legalizar. Em política internacional vale tudo, e quem não incorporar estas novas tecnologias, irá eventualmente ficar para trás.
Estamos literalmente a assistir ao início da separação entre o estado e o dinheiro. Cá em Portugal, a legislação de criptomoedas é praticamente inexistente, e para os especuladores, sim, não se paga impostos. Quem quiser participar no faroeste, tem-no à distância de um click, e nem precisa de apresentar fatura no fim.